Terça-feira, 24 de Junho de 2008

O GRACIANO DO CASAL DA MATA

 

 

 

Já falecido há largos anos em acidente de trabalho enquanto funcionário da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere, curiosamente em trabalhos na estrada de Dornes, muito próximo da sua casa, era uma figura original e muito notória devido a características pessoais e familiares que o evidenciavam no nosso pequeno mundo rural.

 

 Com efeito, Graciano tinha uma figura imponente, com 1,99m de altura, sendo seguramente o homem mais alto da região. Em contraste com a sua elevada estatura, era casado com uma senhora do Outro Lado do Rio, terra de toda agente que viesse daqueles lados, (ainda viva) que é, por oposição, a mulher mais baixa que se conhece em toda a região (talvez com 1,20m)

 
Era eu ainda criança quando se casaram e lembro-me  dos comentários jocosos a propósito do enlace destas duas figuras tão contrastantes e do sucesso do encaixe conjugal que dali resultaria, nas perfomances de desempenho no acasalamento. O povo rural é por vezes cruel e injusto nos gozos que extrapolam aos seus iguais.
 
Graciano era um homem inteligente, afável, pacífico e excelente conversador, manifestando conhecimentos que a maioria das pessoas não tinham. Tinha mesmo hábitos de leitura de livros indiferenciados que lhe eram oferecidos por um vizinho que residia em Lisboa e ali ia passar férias.
 
Recordo-me também que, quando frequentava a taberna do meu pai, falava comigo com o geito de falar a uma criança como poucos sabiam , sem referências a questões de índole erótica como a maioria dos homens estùpidamente tinham tendência a fazer com crianças da minha idade. (Já pintas? Já passas-te ao Pintado, já namoras, etc).
 
Trabalhou desde muito novo em todas as fainas sazonais para que era falado para “andar fora”.
 
Um dia, andava ele na apanha de azeitona com outros trabalhadores, entre os quais a Bernardina do “Quétano”, já falecida também, mulher atrevida, brincalhona e que sempre gostou do copito. Meteu-se com ele em geito de gozo, chamando-lhe roncolho, por saber-se que ele tinha um testículo recolhido.
Sem hesitações, respondeu-lhe em verso com a seguinte quadra, acutilante e brilhantemente construída:
                                           Já dormi na tua cama
Já mijei no teu  penico
                                         Tirei-te os três vinténs
              Nem por isso estou mais rico
Esta arrasadora resposta, feriu de tal modo a honra e dignidade da suposta virgem Bernardina, que a levou a deslocar-se à sede do concelho para apresentar queixa no posto da GNR.
Não conheço o desfecho nem as consequências que terão resultado da queixa. No mínimo  terá sofrida a perda de um dia de trabalho e obrigado a calcorrear os 15 Km a pé para se deslocar até à Vila, no que terá sido a pena menor que terá tido que suportar, devido à sua inspiração poética declamada do alto de uma oliveira, que só a dita Bernardina não aplaudiu.
Até Camões  morreu incompreendido e na miséria.........
As queixas mesquinhas às autoridades em desentendimentos apenas por troca de palavras consideradas  ofensas “à minha pessoa” eram muito comuns e levadas à justiça em defesa de brios que a miséria das suas vidas reclamava para a sua própria dignificação, apesar do espirito de humor muito próprio que havia entre as gentes, que com sarcasmo e uma habilidade própria da sua linguagem, transmitia por vezes recados e missivas que se diluiam em pura galhofa.
Ccarifas

 

publicado por carifas às 20:15

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De M. a 3 de Julho de 2008 às 16:44
Pelos vistos já vem de longe a recorrência aos Tribunais e meios competentes, por tuta e meia!Será que na altura também havia pilhas e pilhas de papel mal gasto e funcionários desesperados?!
Mas que era giro saber o final da sua narrativa, era....Fico á espera.....Cumprimentos M.
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